E depois do Brasil, o Maracanã
Posted by REPÚBLICA BANANA PEOPLE em julho 14, 2014
O ambiente e o rival dignificam o triunfo alemão em uma final impossível para o capitão argentino, mais futebolista que goleador
- ESPECIAL Tudo sobre a Copa do Mundo 2014
O momento da Alemanha chegou no melhor dos cenários para ser a primeira seleção europeia a vencer a Copa na América. O Maracanã e a Argentina dignificaram o triunfo alemão em uma excelente final, intensa, divertida e igualitária, impossível para Messi, mais futebolista do que goleador no Rio: o mundo invertido no dia em que se disputava o título. Abatida desde 1996, quando levantou a Eurocopa com Vogts, a Alemanha soube digerir as dolorosas derrotas para a Espanha na Eurocopa e na Copa e engolir também os chutes de Balotelli em Varsóvia para cantar vitória no Brasil com um gol de um de seus grandes recursos: Götze.
Apesar de ser exigida ao limite, a equipe de Löw não falhou no último esforço, vencedor precisamente quando sua hierarquia em campo esteve mais discutida do que nunca por um oponente que cresceu e melhorou muito, um colosso defensivamente, só necessitado do gol de Messi. Para a Argentina, não serviu de nada levar o 10 até o Maracanã e a Alemanha até a prorrogação, sendo dominada pela melhor equipe do torneio, quatro vezes campeã, a seleção da moda por sua riqueza futebolística e jogo harmônico, digna sucessora da Espanha. Não foi o Mundial de Messi, mas o da Alemanha.
A Argentina de Messi jogou sempre como visitante orgulhosa, a do contra, e também na final, que disputou com sua camisa azul devido à condição de mandante da Alemanha. Ninguém fala bem da Alviceleste, e muito menos o anfitrião Brasil, martirizado pelo cancioneiro da torcida que tomou as sedes da Copa onde a Argentina jogou. O calor de seu fanatismo foi o combustível de uma equipe cujo maior elogio recebido foi o de sua competitividade, uma forma elegante de não falar de futebol mas de todas as coisas que o rodeiam, nem sempre para o bem, já que há que ser respeitoso com a Argentina.
A partir do amor próprio, possuída por uma fé cega no triunfo, a tropa de Sabella combateu a indiferença e o despeito até transformar cada partida em um ato de afirmação, de conquista, de terreno ganho em busca do Eldorado Maracanã. Não parou de incomodar, muito bem armada em seu campo, à espera de Messi. A sensação era a de que ainda estava para ser visto o melhor da Argentina e do 10. Impunha-se então continuar resistindo, defender e contra-atacar, sem se esquecer de jogar, ainda mais diante da famosa Alemanha, a outra face da Copa.
Com os alemães acontecia justamente o contrário, depois do estrondoso 7 a 1 contra o Brasil, um placar que transcenderá 2014 para se tornar um dos maiores impactos da história da Copa. A Alemanha tinha mostrado o melhor dos repertórios, já passava por campeã sem a necessidade de vencer a final, era a seleção mais adulada e mimada do Brasil. Não há seleção capaz de repetir uma partida tão memorável, nem a própria Alemanha, diminuída no Maracanã, vítima da lembrança do 7 a 1.
A equipe de Löw não teve a autoridade que se supunha, diminuída pela lesão de Khedira e reduzida pelas sacudidas da Argentina, que encontrou uma via de acesso no flanco esquerdo defendido pelo central Höwedes. Lavezzi foi pela lateral e Messi foi tão seletivo quanto desequilibrante com suas arrancadas, suficientes para gerar a sensação de perigo. Os argentinos interpretaram muito bem a partida e atacaram os espaços gerados pelo atrevimento dos alemães, de modo que o resultado foi uma final muito divertida no Maracanã.
Até as oportunidades se alternavam nas áreas, no início na de Neuer e depois na de Romero, ambos muito exigidos em uma partida de ida e volta, com muitas alternativas e ritmo. Higuaín não foi feliz em um mano a mano com o goleiro, nem mais tarde Palacio, e a trave devolveu uma cabeçada de Höwedes. Não foram as únicas, porque as aparições de Müller e Messi foram tão escassas quanto luminosas no Maracanã. Para Müller, faltaram parceiros e a equipe se descompensou sem Khedira e depois sem Kramer. E para Messi falou pontaria diante de Neuer.
O 10 teve três chegadas que não entraram por um triz diante do gigantesco goleiro da Alemanha. Messi se livrou bem da marcação, controlou melhor a bola, procurou o ângulo de tiro e focou na trave e não acertou o chute. Messi não se desesperava, havia a sensação de que ele ainda tinha energia, de que para a Argentina valia a pena não desfalecer, mas ali havia menos equipe com Agüero do que com Lavezzi. E assim como nessa temporada no Barça, o momento Messi não chegou com a Argentina, nem ele foi Maradona, nem resolveu com uma jogada, que era o que se pedia. Ninguém exigia que jogasse bem, coisa que ontem fez mais do que em ocasiões anteriores, mas que deixasse um gol para a história. Não conseguiu e a FIFA lhe deu a Bola de Ouro da Copa.
Nada do que a FIFA faz tem sentido ultimamente, por mais que Messi seja o número 1. A Copa, no entanto, já não é ganha só por um jogador, mas por uma equipe, como constatou a Alemanha, que precisou de Götze depois que nem Müller nem Klose nem Kroos conseguiram. A Alemanha voltou, vencedora com um futebol moderno e sedutor, muito distante do que praticado pela Mannschaft, enquanto a Argentina esperava que Messi fosse uma cópia de Maradona. Os tempos mudaram e o maracanazo caiu no esquecimento depois do 7 a 1 da Alemanha contra o Brasil. Ramon Besa – http://brasil.elpais.com/brasil/2014/07/14/deportes/1405290124_263560.html
A Alemanha ganha como nunca
Os alemães dão à Europa o primeiro título na América ante uma resistente Argentina
Ninguém jogou melhor no campeonato que o time do técnico Joachim Löw
- FOTOGALERIA As imagens da grande final no Maracanã
- ESPECIAL Tudo sobre a Copa do Mundo
O Messi atual não bastou para ser o protagonista com que tanto sonhava a sua querida Argentina. A final chegou tarde para Leo. Para Götze, ela não pôde ser mais pontual. Um gol para a história pelo seu valor de romper uma barreira imbatível desde 1930: pela primeira vez, a Europa pôde comemorar na América. O mérito fez justiça a uma grande equipe, uma seleção que sempre foi respeitada porque botava medo. Agora, a Alemanha, com seu quarto título, merece ser admirada. Ninguém jogou melhor na Copa. E, com poucos recursos, ninguém foi tão competitivo quanto a Argentina. O jogo tornou maiores as duas equipes.
A Argentina se impôs e fez mais do que parecia ser capaz, pelo menos pelo que mostrou em sua estupenda atuação no maior dos dias. O time foi unido como sempre, mas nunca aceitou o papel heroico dos mais fracos. De acordo com seu DNA, todos foram argentinos até a medula, com tudo isso que supõe: nada de se intimidar. Sob a batuta de Mascherano, a Albiceleste fechou-se à frente de seu goleiro, mas não titubeou em sair com ímpeto para o jogo.
A Alemanha, glorificada para sempre depois de arrasar o Brasil, sentia-se ameaçada, não estava diante de um adversário com taquicardia. Higuaín a fez prender a respiração após um erro grotesco de Kroos, que tentou recuar de cabeça para o goleiro quando no meio do caminho estava o Pipa. O atacante argentino correu em linha reta, cara a cara com Neuer, mas chutou torto. Às vezes, com o gol tão próximo, alguns ficam cegos. Higuaín, por duas vezes, teve o paraíso na ponta das chuteiras. A realidade o superou. E ele acabou indo para o banco.
A equipe de Löw, didática e harmônica com seus passes subordinados, remava pela lateral de Lahm e Müller, mas na outra borda tinha uma brecha considerável. Özil, o de sangue frio em tantas ocasiões, não auxiliava Höwedes, um zagueiro adaptado como lateral, de carroceria pesada. A equipe de Sabella matou a charada, e seus ataques chegavam por essa rota de fuga. Em uma delas, Lavezzi, depois de uma excelente manobra de Messi, disparou e cruzou para Higuaín mandar para redes –mas com um corpo de impedimento. O ataque seguinte coube ao capitão. Messi fez uma infiltração tipicamente sua pela esquerda de Neuer, mas Hummels e Boateng se juntaram para varrer a bola quando ela se aproximava do gol.
Um fato acidental corrigiu os alemães. Kramer, escalado na última hora para o lugar de Khedira, que se sentiu mal no aquecimento, sofreu uma forte pancada num choque de cabeça com Garay e foi a nocaute. O garoto saiu grogue, e Löw recorreu a Schürrle, que cobriu o vazio deixado por Özil na esquerda, fazendo o atleta do Arsenal se deslocar para o centro, onde tem melhor visão panorâmica e atribuições menos tediosas. A Argentina já não tinha caminho livre, e Höwedes devolveu o susto de Higuaín com uma cabeçada na trave, nos estertores do primeiro tempo. Schürrle, além disso, produziu alguns quantos arremates.
Sabella, ou seja lá quem for, moveu as fichas no intervalo, e Messi trocou de sócio: Agüero, que atravessa uma época de abatimento, deu lugar ao ativo Lavezzi. Em nada melhorou a equipe sul-americana. Leo recuou um passo, tendo o Pipa – e depois Palacios, seu substituto – e Kun como referências. Na frente, Özil se animou, e a Alemanha encontrou outro recurso. Não houve quem conectasse o gancho final, por mais que o confronto fosse lá e cá, com labaredas em ambos os lados. Messi estava lá – não aquele de outro planeta, mas estava. E isso é muito. Quem também andava solto era Müller, esse predador que caça gols como num safári. A partida, sem parêntesis para o tédio, tinha curvas, ninguém estava a salvo. A Alemanha, exuberante e sem se acomodar, não deixava de insistir. A Argentina, com seus corsários, não baixava a cabeça: o reputado Schweinsteiger não impressionava Biglia, nem Enzo Pérez se esgotava diante do badalado Kroos. O duelo era sufocante, de alta voltagem, sem tempo para uma piscadela. Com a pulsação disparada, já na prorrogação, quando as cãibras campeavam no gramado, de novo a Argentina teve o céu aos seus pés. Palacios, tendo esse Golias que é Neuer no seu nariz, tentou encobrir o goleiro. O argentino mascou a bola com a tíbia, e ela foi para o vazio. Aí a Argentina se desvaneceu, já com Messi fora de foco.
Com os pênaltis à vista, Schürrle se aventurou pela esquerda, e seu cruzamento caiu aos pés de Götze, que afundou a Argentina inteira –e talvez também Messi, o último grande gênio, o menino de Rosário que até ontem cumpria todos e cada um dos sonhos alvicelestes. Para ele não haverá consolo na Copa. A Alemanha o impediu ao ganhar como nunca: por seu bom futebol e por seu rastro indelével na América. E ganhou em pleno Maracanã, que expressava o seu mal-estar a cada imagem da presidenta Dilma Rousseff. Para o Brasil, a Copa deixa um gosto amargo. José Sámano – http://brasil.elpais.com/brasil/2014/07/13/deportes/1405272492_356517.html
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